“E aí? Tá feliz?”

Eu sou uma pessoa de bordões. Eu tenho vários. Na festa dos meus 33 anos, nós fizemos desses bordões o enfeite das mesas. Não é que eu queira, mas de vez em quando eles surgem, em geração espontânea e eu acabo os adotando.

Um dos mais marcantes é esse aí do título: “e aí? Tá feliz?” Não devia ser uma pergunta difícil. Mas quem não me conhece e ouve essa pergunta pela primeira vez quase sempre toma um grande susto, como se a pergunta fosse muito íntima ou se nunca houvesse pensado nisso.

Ora, mas aí é que estamos, leitor e eu. O que é a felicidade? Eu não vou ser arrogante a ponto de tentar responder a essa pergunta. Porque eu francamente acho que o sentido de felicidade é uma construção individual, mediada (obviamente) pelos valores e crenças de cada um. E por isso mesmo, não deveria ser difícil ou invasivo responder isso. Daqui pra frente, vou falar sobre o que é felicidade para mim.

A felicidade não é, a felicidade está, porque a vida flui. Sendo assim, a pergunta não é se você é feliz. Porque o ser, enquanto verbo estacionário, não permite ação ou agência. Já o estado, sempre provisório, sempre influenciado pelo profundo e belo agora, exige ação, mesmo que seja para manter o equilíbrio precário.

A felicidade não acontece. A gente não tropeça na felicidade por aí. A felicidade se constrói, em pulsos, em ondas. Claro que a vida vai nos dando momentos memoráveis. Mas eles não são a felicidade. São marcos, elementos de composição, como cores de fundo, detalhes de algo muito maior que é a experiência única e irrepetível da vida.

A felicidade, como estado, só acontece quando a gente consegue ser sendo. Para conseguir ser feliz, é preciso um estado de presença, um consciência de si mesmo, um autoconhecimento das limitações e das potencialidades. A felicidade vai sendo cultivada, paulatinamente, pelo encarar-se no espelho, mas não como desafio, gládio, combate, mas pela reflexão, pelo trabalho de olhar-se multifacetado, no amor e na multiplicidade das contradições que nos tornam únicos.

Assim, a felicidade vai brotando de dentro da nossa presença do mundo. E ela brilha, destruindo as máscaras, as camadas, as massas corridas dos personagens que criamos para nós mesmos, e se configura nas rugas, nas marcas na pele, nas cicatrizes e nos olhares curiosos e voltados ao desconhecido. A felicidade não está no outro. Não está na coisa. Não está nos planos infinitos de nunca chegar. Está aqui, agora, hoje, nas escolhas que fazemos, na presença que podemos ter, na capacidade que todos nós temos de amar, inspirar, seduzir, compartilhar, dividir, sentir, impulsionar, aprender… a felicidade está onde nos fazemos mais vivos.

E aí? Tá feliz?

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