Destino

 

Destino. Foi a primeira palavra que passou em sua cabeça pouca antes de perceber o sangue lentamente tapando seus olhos. Abaixou a arma, limpou o sangue do rosto e tentou aguentar em pé o quanto pôde. Não sentia dor, ao contrário do que supunha. Apenas as cores foram ficando mais brilhantes. Sorriu, e olhou para ele uma vez mais. Never forget, never forgive, somebody said. Ele havia sentado no chão e chorava copiosamente com a arma ainda esfumaçando na mão esquerda. Jogou longe e ela quicou no asfalto duro, fazendo um barulho seco de metal. Era apenas um garoto, com olhos tristes e carregando nos ombros bem mais do que era capaz há tempo demais. Mais ninguém, nem mesmo a vida, prepara alguém pra ser tão forte.

Acabaria ali? Ele sabia que sim. Não havia mais jeito para ele, era só uma questão de tempo. Um tempo que ele mesmo não sabia se merecia. O garoto merecia a sua vingança. Se alguém era culpado pela sua morte, era ele mesmo. Seria um arrependimento? Uma tentativa de racionalizar o inevitável: em pouco tempo seu coração ia parar de bater e ele iria virar história. Podia matá-lo. Mas do que adiantaria isso agora? Que honra havia em matar um garoto chorão sentado no meio do asfalto a meio caminho de onde Judas perdeu as botas?

Abriu a jaqueta lentamente. Precisava de ar. A pistola agora parecia tão pesada… deixou-a cair a seus pés. Tirou o maço de dentro da jaqueta e a muito custo acendeu o cigarro. Tossiu. De dentro da boca saía um gosto meio podre e macilento de sangue empapado. O coração começou a desacelerar, e ele pôde finalmente sentir a dor excruciante de um corpo que grita que não quer morrer. Não, não, sem arrependimentos. Tudo foi como deveria ser.

Juntando toda força que ainda lhe restava, deu alguns passos vacilantes em direção ao garoto. No terceiro, ele tropeçou nas próprias pernas, caindo com o rosto no asfalto quente. Virou-se, olhando para as gaivotas que passavam por ali sem se importar realmente com nada que ocorria ali embaixo. Era um dia normal para ser gaivota.

Era um dia normal para morrer. Um dia banal como outro qualquer.

 

 

 


 

Eu-lírico

Toda minha vida andei só, sem ninguém para me dizer por onde ir, nem quando esperar que o tempo passe e as coisas mudem. Nunca fui amado e amei muito pouco. Não que eu tivesse um coração de pedra, ou fosse cruel e insensível. Sempre fui um nulo. Ninguém me notou. Não deixei lembranças minhas por onde passei, nem nunca despertei saudades. Nunca fui desejado, as mulheres nunca pararam para me olhar na rua, nem mesmo nos meus vinte anos, quando tinha um sorriso garboso e porte atarracado. Eu sou um velho, penso como um velho. Carrego no corpo as marcas dos muitos anos que não disse o que pensei, dos desafios que deixei passar e das oportunidades que a vida me deu e não tive coragem de aceitar. Me arrependo. Nada do que fiz vai durar mais do que o meu último suspiro. Deixo posses, mas não deixo herdeiros. Uma vez só fiz amor… ah! Eu lembrei disso toda minha vida! Aquela mulher em flor, com cheiro de leite de colônia e lábios quentes… ainda hoje me derreto a pensar naqueles lábios, que uma vez na vida tive, mesmo que pagos. Que me importa ser quem sou? Não tenho amigos, não tenho fotos de pessoas penduradas na parede, nem mesmo minhas. Não quero lembrar o que fui para que não seja ainda mais doloroso ser quem sou agora. Carrego nos ombros o peso de todas as minhas frustrações. Nunca disse a ninguém que teria saudades, que gostaria que essa pessoa não se fosse. E todos se foram. Mesmo nas minhas lembranças as pessoas se perdem. Vejo os rostos de tantos desconhecidos quando fecho meus olhos, mas não consigo associar nenhum a um nome. Nem do rosto de minha mãe eu me lembro, que dirá dos meus colegas de serviço. Já se vão tantos anos… Vejo no espelho o meu rosto cansado. Olhos fundos, rugas, a boca murcha já sem dentes que a preencham. Não fui nada, não fui ninguém. É isso, um nulo, um zero, um nada. E carrego em mim a tristeza da verdade sobre o que eu não sou. Penso que a morte seria uma misericórdia, uma última companheira para um beijo apaixonado, ou nem isso, quem sabe apenas um abraço, um acalanto mórbido que me levasse para um lugar onde não tivesse de me preocupar com minha falta de lembranças. Um lugar onde não precisasse ser eu todos os dias. Mas não peço isso. Não acredito em Deus, mas todos os dias penso no que será que tem no outro lado. Talvez a minha infância. Não que fosse feliz, a infância, mas eu não tinha de me preocupar com nada que não fosse comigo mesmo. Mas ela está lá, tão distante, tão inacessível. Foi um sonho longo do qual não devia ter acordado. Viver é um absurdo. Viver a vida, e não deixar nada é um desperdício.

E hoje nessa carta longa que provavelmente não será lida, pego-me pensando em tantos que são como eu. Tantos que não têm o brilho nos olhos, a certeza de fez algo que dure. Tantos nulos, tantos quanto as estrelas. Anônimos. Um exército de nadas que nem para preencher os vazios do tempo servem. Quem sou eu? Eu não sei, nunca soube. Só sei que perdi o tempo que me foi dado. É tudo sobre isso, sobre o tempo. O tempo que não passa agora que estou nesse lugar onde posso ouvir o vento cantando nas árvores. E sorrio. Fecho os olhos e imagino que ele me leva, me carrega pelo céu e que posso ver o mundo lá do alto. Uma vez só, de cima, sem medo do meu peso quando chegasse ao chão. Uma vez só, voar, com os braços abertos, como eu fazia quando era um moleque de bermudas gastas e dentes brancos. Uma vez só voar, sem medo de que fosse um sonho a brisa que me carrega, o acalanto suave das nuvens sobre os meus dedos. Uma vez só voar, ser livre, errático, não querer todos os dias ter o controle sobre o que faço e sinto. Uma vez só deixar que tudo me leve pra um lugar onde nem eu nem ninguém poderia prever. Um lugar onde coubessem todos os sonhos.

Mas nem isso… mas nem isso…

 

 

 

Expansão

Urbana legio omnia vincint

Era uma terça-feira de frio no céu brasiliense[1] sem nuvens. Era agosto, como agora e assim como agora também não chovia há mais de dois meses. Eram onze horas, mas parecia madrugada. O vento frio, seco e sujo[2] batia nas minhas costas, sujando a blusa branca do colégio. Eu andava só. Eu não tinha medo. Nunca tive medo, mesmo quando, de noite, era acordado pelos tiroteios.

Mas eu não tinha medo, e olhava a cidade de casas sem reboco, árvores retorcidas, caducifólias. Pés que iam ao trabalho, bocas que ardiam, não pela secura, mas pelos assuntos: agridoces. As línguas ferinas iam e viam. As pipas voavam, ternas, embevecedoras. Dormiam nas ruas os cachorros vadios.

E havia fome[3], porque havia desigualdade. Mas havia a solidariedade, gentileza. Havia tudo isso e mais um pouco. Não se espera das pessoas coerências; muito menos das mais simples.

E havia a polícia. Não é bom falar da polícia. Eles voam, de helicóptero. Eles matam. Não se fala dos que matam[4]. Não tenho medo, nunca tive, mas não falo dos que matam. Eles também não têm medo.

E havia o sol. O sol pra todos[5] até pra quem não quer. Mas ele não vinha, deixou o calor pra lá, nos outros bairros.

E havia os redemoinhos. E a terra vermelha que cobria o céu, as casas, as gentes, os cachorros e as línguas. As placas, os sinais, as histórias e as vidas. As paredes, os pincéis, as igrejas, a poesia!

Sim, a poesia! Branca, negra e índia. Incólume[6], embora lânguida. Virtuosa. Profana como os quartos das casas, onde as moças tocam-se, mútuas. Sacra, como o choro errante na última ave-maria. Impávida[7] e esdrúxula. Fática. Indócil.

Invisível

Mas permanece…

 

 

[1] Um céu de ilusão sem nuvens, indescritível. O céu, de solidão, mar calmo, onde dormem os anjos…

[2] Não há mentiras nem verdades aqui. Há o vento…

[3] Dos meninos que têm fome, que não têm berço ou sobrenome, das cidades que se esconde, das ruas vazias na madrugada.

[4] Reminiscências de uma vida honestina. Maconha, ácido, cocaína, lança-perfume, merla, gasolina. O que vier que bom para esquentar rua…

[5] Tu vais abrir-me a porta quando bater na janela do teu quarto?

[6] Macbeth, Macbeth. Onde vais que dormitas? Traga-me o ábaco para que conte o resto dos seus dias.

[7] Ostentas o lábaro, colosso que és.

Guajará

Guajará…

Tupinambá…

Céu azul

No Pará

Guajará

Quem vai me domar

Guajará

Belém, América do Sul

Guajará

Quem me viu, quem me vê, quem quer ser meu amor?

Quem te vê?

Mas a terra do sol não se incitou

Quem te vê?

Meu amor não é mais do que a pedra de urucum

Tacacá

O Pará dominará o vermelho e o azul

Coração

Quem me quer, quem me quer, quem me ver me verá

Nascerá na virtude o reflexo

Anverso do açaí

Manacá

Maniçoba, pato ao tucupi

É canção

É o teatro da paz

É mangueira

É carnaval

É carnaval

É carnaval

Canavial

É emoção

É o amor em Belém do Pará

É solidão

Quem meu quer, quem me quer, vai ter de me ouvir

É meu fim

Gaivotas na praia querendo subir

Cada vez mais

É a paz, é a paz, é Fafá cantando pra mim

É ainda mais

Bem mais perto, mais perto de mim

É Guajará

Quem quiser

É guaraná

É céu azul

É estrela, é Paysandu

Remo pra lá

Vou te levar

Vou te levar

Vou te levar

Pro ar…

Pra não dizer que não falei de flores

Prólogo

Arauto

Vós que amais de olhos fechados

Ouvi-me!

É cedo

E a noite ainda dorme.

Filhos amados

Permitam-se

O sono dos justos já não revigora

E a amor não balança os corações.

Ouvi-me, justos!

O grito dos ímpios me atrapalha!

É preciso ver surgir na Terra outro dia

Colorido com flores dos jardins!

Ouvi-me justos, ouvi-me!

Já não há flores, nem quintais!

[Tocam trombetas]

Fada

Nem que eu precise mais canção!

Dormem na noite os justos

E descansa na pele o regaço

Lutam contra o destino imundo

Façam o mesmo que faço!

Brilhem! Iluminem a noite com o lume!

Façam da poesia a música alegre!

Anjos do céu! Venham comigo!

Filhos da Terra, toquem o sino!

Homens! Homens! É chegada a hora!

Nem medo, nem frio, nem degola!

Sigam o sonho, cantem o hino

Acompanhem de perto as trombetas

[novamente as trombetas]

Arauto

Homens, anões e duendes!

Pássaros, flautas, estrelas cadentes!

Flores, regatos e pântanos!

Mares, céu e vento!

Caminhai, caminhai!

É chegada a hora!

Quebrem-se os muralhas

Abram-se as portas da percepção

Destituam-se os generais

Percam-se os exércitos da Terra

É chegada a hora, é chegada a hora!

Viscondes, duques, marqueses

Proletários, vagabundos, burgueses

Eis o hino! Eis o hino!

Vícios mortais, eis que vem

Ao longe os Neandertais!

Fada

Europa! Europa!

Traga a primavera!

O fogo toma o céu!

Fervei, fervei, navegai!

Filhos da corrupção, tremei!

De longe os alquimistas!

Eis que vem o sol

Dourando a pele dos bárbaros

Arauto

Cantai, ó justos, às vilanias do mundo

Cantai, antes do cadafalso dos tiranos

Cantai

Coro

Respirar o ar

Respirar

Respirar o ar

Respirar

Fada

A canção nos toma

Coro

Respirar o ar

Respirar

Respirar o ar

Respirar

Arauto

Navegar

Navegar!

Todos

É o tempo!

É o tempo!

É o tempo!

É o sol!

[fecham-se as cortinas]

Cena 1

[casa de Casíodo]

Casíodo

Quem for me ver

Me envenenar

Ou me ensinar

A ver o céu azul

Quem for me ver

Envenenar

Saciar

A flor e o barril

Quem for me ver

Envenenar.

Caminham as aves

Mostram os caminhos ao sol

Voam as formigas

Arrastam-se os jacarés!

Quem me ver

Quem me ver

Quem me ver

Já é.

[entra Helena]

Helena

Caminham as formigas

Voam as aves

Nadam os jacarés

Casíodo

Quem se importa?

Helena

E as trombetas?

Casíodo

É o fim!

Vida longa à iniquidade!

Helena

Somos pecadores, Casíodo.

Tenho medo!

Casíodo

Somos reis entre os homens!

Nada nos atinge

Íntegros dirigentes dos destinos

Sou rei!

Que me importa?

Não há pedras suficientes

Para limpar da Terra todos os pecados

Acabou a noite, raiou o dia

Mudou a rota

Ficou o tempo

Não há canção, nem sino ou trombeta

Ficou a majestade,

A glória.

[ouvem-se gritos]

Helena

São gritos que ouço?

É o vento que traz

Ó, destino traçado!

Ó, peito ferido!

É a morte que chega de longe

Atracada em nosso cais!

Coro

Marchai! Marchai!

Avante! Marchai!

É nosso o tempo, é nosso!

Decidamos assim os nossos ideais!

[o povo chega com tochas, paus e pedaços de madeira. Casíodo ergue a espada]

Casíodo

Marginais! Tremei

Como ousai desafiar vosso rei?

Coro

São as flores vencendo o canhão!

Seguir, seguir a canção!

Casíodo

O que há?

[o arauto desce das nuvens]

Arauto

Flagelo das dores é findo!

É hora de trocar a labuta

É tempo, chegado o tempo

Mudando decerto a conduta

É tempo, não percam o tempo

É hora de cair em luta

[Chegam os soldados]

Soldados [em coro]

O soldado não tem medo

Obedece sem razão

Não tem nada na cabeça

Nem direito a oração

O soldado obedece

Não se aprende na escola

Não tem dia, não tem hora

Casíodo [aos soldados]

Matem todos!

Coro [tocando apitos]

Não há morte!

Só há o destino

Não há medo

Segui o caminho

Não há sol só há o tempo

Os alquimistas voam no vento

[Do meio do coro sai o alquimista]

Alquimista

Trotes do mal não adiantam

Não há medo

Só a canção

Não há medo

Só, a canção!

Bradem meus amigos

Bradem

O céu nos escuta

É hora de fazer justiça

É hora de mudar a história

Vilipendiados somos

Mas o amor nos une

É a pele, é a pena, é a mão

Caminhando e seguindo a canção

Sigam o arauto do céu

Helena [de joelhos]

A flor me invadiu

Não vou resistir

Erguei, erguei os canecos

Não há, não há mistério

Não há, não há solidão!

Coro

Salve regina

Madre regina

[teu magno e distinto coração

tua boca de amor e justiça

teu colo que descansa nossa língua

tua pele que transborda a loucura

madre nossa, madre

teu sol é nossa justiça

teus versos são nossa canção]*em latim

Arauto

Os anjos cantam por vossa boca

Helena

De que servem os anjos agora?

Coro

Avante soldados!

Avante!

É hora de seguir o destino

Casíodo

Não há destino, apenas a glória

Coro

Não há glória apenas a canção

Alquimista

Não há angústia, a dor já termina

Helena

É o amor que nos move agora!

Coro

As flores nos ouvem as flores

Acabaram-se todos terrores

Ficou apenas canção, canção!

[ouve-se um relâmpago. Todos balançam pelo vento]

Arauto

É hora de irmos pro céu!

É hora de virem as nuvens!

Adeus mundo, adeus

Alquimista

É a eternidade. É a eternidade

Navegar, navegar

Mudar o mundo

Navegar pelas nuvens.

É outra depressão

Uma nova invasão na cidade

É outra depressão

Nossos sonhos dobraram a metade

É outra depressão

Acabou o silêncio, ficou a verdade

Coro

Venham as nuvens, ei-nos canção

Deixemos a glória de lado

As flores nos vencem as flores

Quebram-se os grilhões do pecado….

Nada é a luta

Ontem a noite

Pareceu ternura

E a lua

Iluminou

O extenso firmamento

Luz sobre  cimento

Liberdade e dor

E meu coraćão sentido

Orgulho ferido

Morte e sensatez

Motor do silêncio

O meu corpo lento

Mãos que configuram

A total simplicidade

A vaga luta da verdade

Contra o cais…

A onda quebra o mar

A onda quebra o mar

A onda a te levar

A onda a te tragar

A onda te sorri

Aonde queres ir

Aonde vais morrer

Aonde vou te enterrar?

Face

Face que a flor

Fornece o furor

Fenece a função

Fornica a razão

E finca a fusão

Felicitação

Lambe que a voz

Suave sucumbe

A face ilumina

A situação

E a noite domina

O dia termina

A fuga, fugaz,

Frutifica o chão

E fica na fronte

A face gentil de Anacreonte

Fundada

No inocente horizonte

Não sabe o lado de onde

A face supondo

Face que firma

Face marina

Face sublime

Pacificação

O pão que suspira

A fascinação

A indolente pira

Que sobe e domina

Que muda e consuma

E termina

E muda e transforma a sina

E muda a face

Ruborização

Face

Que se fosse outra face

Moeda falsa que passa

Moeda falsa que grita

Duas caras na mesma corrida

Em face do mesmo dilema

Fácil

Fático

Fálico

Fim

Confusão…

Parte III – Da Chegada à Puerto Montt ao Aeroporto de Madeira

Eram umas 11:30 da manhã e o sol brilhava entre nuvens. Não estava frio, mas ventava forte do oceano pacífico para a costa quando descemos do ônibus na rodoviária de Puerto Montt. A Rodoviária era toda de madeira. Desci com pressa. Queria ver o oceano. Nunca ninguém da minha família tinha visto o Pacífico. Me sentia desbravando um mundo novo.

Bem, particularmente eu prefiro Atlântico, o Pacífico é um oceano frio, violento. Parece que tá com raiva da gente. Eu sempre vi o Atlântico como um oceano acolhedor que, por algum motivo resolveu afundar a cidade de Atlântida. Provavelmente foi por engano (rsrsrsrsrs). Mas era um choque. Aquele oceano poderoso batendo em rochas escuras, provavelmente de constituição vulcânica. E atrás de mim a imensa cordileira. O Chile é um país entre dois colossos.

Mazé nos lembrou de pegar as malas. E pegamo-nas. Íamos ficar hospedados numa casa a alguns quilômetros do centro. Ela ligou para a hospedeira que nos levaria até a tal casa.

O carro subio uma grande falésia, de onde podíamos ver vários montes totalmente cobertos de neve, o oceano atlântico e a cidade de Puerto Monnt entre eles. Eu soube mais tarde que os montes brancos eram argentinos.  Vi bancos de madeira (tanto os finaceiros quanto aqueles onde depositamos nossas poupanças), prefeituras de madeira, igrejas de madeira, placas de trânsito de madeira, dinossauros de madeira, cachorros, peixes, carroças de madeira. E, para minha imensa surpresa, a casa onde ficaríamos era de…

MADEIRA!!!!!

É, a tecnologia dos tijolos ainda não tinha chegado ao Chile (kkkkkkkkkkkkkkk).

Brincadeiras à parte, era muito mais barato cortas as imensas reservas de coníferas que circundavam a região (com árvores de pinho, principalmente) do que retirar argila dos rios para fazer tijolos. Isso eu só soube dias depois.  O lance engraçado é que nós ficaríamos hospedados na casa ENQUANTO a família também estava lá. Mais um dos estranhos costumes chilenos, como tomar água da torneira.

Mas bem, voltaremos a falar desta casa depois.

Almoçamos, fomos ao evento, participamos da abertura com muitas danças típicas chilenas e muitas pessoas falando em espanhol. Ainda comi carne crua (sim, eles fazem canapé de carne crua…).

Fomos para o centro de Puert Montt, tiramos fotos, liguei para dona namorada de dentro de um shopping de madeira (mas foi minha sobrinha que atendeu…) e depois fomos pegar o Francisco no aeroporto.

****

Então, o Francisco é o chefe. Eu, o Rodrigo e a Mazé somos bolsistas do mestrado da UFRJ e ele é doutor pela COPPE. Trabalhamos no mesmo laboratório e ele estava lá no Chile para supervisionar nosso trabalho e para apresentar trabalhos científicos. Então, claro, fomos os três para recebê-lo.

Estava frio, mas não muito e partimos para o aeroporto de Puerto Montt. Sim, era de madeira. Sim, o vôo atrasou. Sim, o frio ficou pior. Sim, fomos para a casa onde estávamos hospedados. Sim, decidimos mudar para um hotel na manhã seguinte.

Sim, essa parte da história ficou chata, mas a próxima é melhor.

Abraços a todos

P.S.: Resolvi incluir umas fotinhas clicaumentáveis pra ficar mais interessante o poste!

Vento fugaz

Vento nos cabelos
Vento nos cabelos

Fácil como o vento
Cumpro meu intento
E possuo com os dedos o sol
Escaldante da minha terra.

Sigo, me acho
Percorro utopias
Com os olhos fechados
E surrupio histórias
Perco-me em memórias
Infernos astrais

Julgo, reconheço
Tombo, pois mereço
Sinais artificiais
Dos fins que desconheço?

Vegeto, impávido
Corro errante
Caráter dominante
Que me implode, perfaz

Mas se me erro, me quebro
Faço inatividade onde há sol
E faço sol onde há apenas o momento

Derradeiro
Sorrateiro
Fugaz

Para Aline Lima

Bate estaca

vamo bater lata
bater bolo
batucada
na beira do precipício
vamo bater cara
abrir na marra
a situação
fazer sinestesia
é poesia
é insinuação
vamo ver de perto
verdugo, verdame
largo do verdun
ver a viradura
sacadura
é maré
que vira a via louca
ditadura
cala a boca
dá no pé
vamo dar risada
anistia
de qual é
é fazer loucura
fissura
formosura
igarapé
o mangue tá maluco
relógio cuco
que bate num segundo
sai de pulo
sai de ré
praia do recreio
leme
pontal
paranapanema
massacre
luta
no campo
na rua
na chuva
sapê
vamo vê
gingar
capoeira
no pará
o pontal
carajás
no pontal
tudo igual
jacaré
no pontal
tudo azul
zona sul
desessete
fita casseta
ak 47
cassetete
na cara do prefeito
é suspeito
é safado
proletário
bruzundanga
febre candanga
que vem zumbindo do céu
iluminando as sementes
fazendo do coro da gente
curtição
suspensão
suspirar…

pra ti eu invento palavras
umas nunca ditas
as quero pra ti
para tecer-te um poema
sem rima talvez
sem os nossos porquês
sem as ausências de nós
um poema que te aqueça os pés

sim, quero dar-te essas palavras
palavras tuas
que te sirvam de colo
um colo meu.

***************************************

Presente bonito de uma tarde solitária.

Don Chico Chicote

Don Chico Chicote
Rumou no cangote
Do cara de lá
Meteu compromisso
Perdeu o juízo
Matou o bandido
Tentou se matar
Don Chico Chicote
Virou meu mascote
Mascate, má sorte
A lebre de corte
No Maracangá
Don Chico Chicote
A faca quer corte
A paz que eu preciso
Pra revigorar
É sangue, quer morte
Do Chico Chicote
Da ponta da aba
Do chapéu panamá
Don Chico Chicote
O Padre te espera
Pra se confessar
Don Chico Chicote
Rumou para o norte
Batizou dois filhos
Pulou todos ritos
Sangrou dois cabritos
Pra raiva passar…
Pulou de um anjico
Pendurado o pescoço
Seu lábio, seu rosto
Irascível, balança no ar….

Assim disse Zaratrusta

Cai a pedra do céu
E circula o chapéu
A voar sem parar
A saber procurar
Esquecer sem saber

Cai o pedaço e retrato
Outro beijo, abraço
Escondido no peito
Procuro o respeito
E vôo demais

Ai que me dói esquecer
O silêncio me mata
O barulho escapa
De perto sou nada
De perto sou tudo
Vagando no mundo
Fazendo palavras
Confissões amargas
Sou perto, sou certo
Sou ar

Ai que me dói o suspiro
Não nego, não faço
Não saio comigo
Não teço, não digo não!!!

Zaratrusta
Flor flamejante
Alma cadente
Estrela e balão
Zaratrusta
Revolução
Tremeluzente
No peito doente
Finco minha própria mão

Zaratrusta
Assim falou
Zaratrusta
Assim escreveu
Antes da morte
Antes do fim
Cadáver errante
Erra pra mim
Flor lacinante
Brilha demais
Alma cadente
Estrela fugaz

Zaratrusta
com seus morcegos
E espetáculos
Pontas dos dedos
Receptáculos
Mundo que gira
Nas páginas
Mais destemidas
Almas vazias
Tupinambás

Anestesia

Sebastião Salgado

Sebastião salgado – Açúcar

Quem sou eu?
Quem eu sou?
Se sou rei…
Que rei sou?
Ou serei?
Que restou?
Fim da noite…
Solidão
Carcará
Catamarã…
Corresponde a correr
De manhã…
Meu amor…
Diz pra mim
Jaçanã
Meu amor, diz pra mim
É maçã
Maracanã
Febre terçã
Meu amor diz pra mim
Só o fim
Que saudade do beijo
No ar
Que vontade
Maracujá
Que retrato escondido
Açucareiro
Febre do mel
Pesadelo
Febre da Terra
Machado guerreiro
Fonte de céu
Bruzundangas
Vales que viram montanhas
E eu nunca mais vou chorar
As balas riscando o ar
Me fazem poeta vindouro
Amando na fé o tesouro
De ter de viver sem chorar
De ter de viver sem chorar
De ter de viver sem chorar
De ter de viver sem chorar
De ter de viver solidão
Minhas lágrimas molham o chão
É chuva que corre o sertão
É sorte de te encontrar
Me manda pra vida esperar
Me traz bem pra perto do fim
Me ensina a dizer só sim
Me ensina a entender meu amor
Me faz suspirar de sapé
Da ponta da rua é que é…
Me dá um pedaço de tu
Andando na ponta do pé

Morena

 

Luz do sorriso

Peça que a peça

Não me mereça

Ou não aconteça.

Pode ser fácil

Pode não ser

Onde a cabeça

Se esqueça

Vai ter dendê

Ou futebol

Conheça o sol

De novembro

É Mamulengo

Cortanto o ar

Sambolalá

A mulata vai suspirar

No meu salto

Tropas de assalto

Céu de Odessa

Peça que a peça

Pode quebrar

Tropa de elite

Samba-sulfite

Tamborilá

No meu dedo doente

Ó o decote indecente

Ó a estrada supimpa

Olha a dor de barriga

Menina quer me chupar

A boneca inocente

Quer suspirar a semente

Quer dividir o meu leite

Quer batizar o meu pé…

Samba menina

Roda a cachola

Senta no colo

Vem me beijar

Samba menina

Meu abandono

Cabou com meu sono

Não pode parar

Samba menina

Deita na rede

Cai que nem peixe

Na lábia do meu orixá…

De Volta ao Inferno

Envenenar

Sentir na pele o gosto amargo

Do silêncio, medo e dor

Envenenar

Cuspir de volta toda face

Desesperar-sem em toda parte

Cair aos pés e redimir-me

Envenenar

Olhar o eclipse solar

Que seja eterna a escuridão

Que seja lua a Terra escura

Que venha o mar a me tragar

Envenenar

Cortar o grito da garganta

Esquecer a vida santa

Criar o meu altar de dor

Envenenar

O gosto etéreo da cobiça

Do cigarro vagabundo

Da fumaça de automóveis

E suor de corpos nus

Envenenar

Seguir viagem e perder-se

Vacilar e não cair

Dormir, dormir e então

Morrer…

Envenenar

Os anjos todos me devoram

Minha carne é espetáculo

Meu sofrimento aumentar

Envenenar

Perder, sumir, correr,

Gritar, cair, morrer,

Tragar, beber e dirigir

Envenenar

O mundo inteiro é meu playground

É esperança que vicia

É qualidade dominadada

Enveneno

Enveneno

O meu veneno

Redimirá o mundo

E trará milhões de abraços

Amigos loucos do meu lado

Dando a vida pelo amor

Envenenar

Envenenar

Minha virtude me condena

Não me guarde qualquer pena

Quando volto sou menos eu

Envenenar

Aqueles todos que me esperam

E toda a dor desaparece

Poesia da cidade

É ópio pros bandidos

Envenenar

E enveneno toda face

Estapeio cada metade

Sem rodeios ou juízos

Sem palavras enveneno

Garrafas e garrafas de sorrisos

São meu mel em toda parte

São minha força escarlate

Destruindo o céu!

Envenenar!

Quem me dera envenenar!

Toda raça inconseqüente

Que arrasta toda a gente

Pra sofrer e esperar

ENVENENAR!

Eu enveneno o sangue imundo

Descartado e seguro

Pó de estrelas decadentes

Pó de arroz, sopro dos dentes

Pó de ossos

Cianureto….

As Crônicas do Vale da Morte

Pouca gente sabe, mas criei um blog novo. Engraçado isso, vai até parecer que eu estou copiando uma outra pessoa muito querida, mas resolvi contar algumas histórias de família. Andei viajando com meu pai essa semana e vi bastante coisa dos meus antepassados, muitas histórias interessantes que resolvi dividir com vocês…

A parte do meu pai da família é de uma região goiana chamada Vale do São Patrício que engloba dezenas  de rios, riachos e regatos, na região nor-noroeste do estado de Goiás. É a região mais fértil do estado, onde planta-se de tudo e que abastece todo o Distrito Federal. Existem principalmente plantações de cana, arroz e grandes fazendas de gado de corte, muitas delas no sistema semi-intensivo. É uma região próspera que sofre com conflitos agrários há várias gerações.

Meu pai vem de uma família bem pobre, de trabalhadores rurais. Quando jovem, trabalhava nas fazendas da região no que desse, colhendo arroz, cana etc. Vivia no mato, caçava os animais que haviam na região e tinha uma vida bem difícil. Foi o primeiro a sair de lá, foi pra Brasília e venceu.

Somos de uma família do cerrado, acostumada à seca, à fome e a contar com o pouco que havia. Sobreviver sempre foi uma luta, desde sempre.

Nessa viagem eu conheci dezenas de parentes afastados. Suas histórias são lindas. Seus exemplos de vida (e morte) são fantásticos.  Resolvi escrever suas crônicas para que elas não se percam.

Um detalhe interessante que percebi é q as grandes reflexões de família aconteceram nos momentos de morte. As Crônicas do Vale da Morte são uma tentativa de mostrar o legado destes homens e mulheres, de como suas mortes e vidas mostraram caminhos, mudaram vidas, foram decisivas para que o hoje fosse como é.

As Crônicas do Vale da Morte são um grito dos excluídos. Minha família representa milhares de outras famílias rurais pelo Brasil. Sua cultura, seus medos, suas esperanças, suas derrotas e vitórias podem ser reconhecidas por muitos que viveram e sofreram coisas parecidas.

Principalmente, as Crônicas do Vale da Morte vêm para ser um grito de vida. A morte é vista com dor e preconceito. Pretendo aqui mostrar que existem outras maneiras de ver o assunto. A morte é uma redenção. Pra muitos, a morte é o único momento de liberdade que é permitido. É o único momento em que não temos de dar satisfações a nenhum coronel, nenhum prefeito, nenhum chefe de polícia. É na morte e só na morte que podemos olhar pra dentro de nós mesmos e reconhecer a luz de Deus.

Meu povo é cristão, tem uma grande fé em Deus e uma grande esperança de dias melhores. Meu povo peca, sofre, mata, morre, mas espera. Espera uma chance, um dia, espera a chuva redentora que trará alegria no cerrado seco de agosto.

Meu povo espera o florir do ipê, rezando a Deus para que a seca não dure muito. Rezando a Deus que tenha piedade de seu povo sofrido e que faça, com Sua mão divina, com que todo o sofrimento vá embora.

As Crônicas do Vale da Morte são uma mistura de tudo isso. Espero contar com a visita de vocês para que possam dividir comigo tudo isso. Peço perdão se ainda não consigo escrever muito bem em prosa. Eu sou um poeta, é difícil não ser prolixo, nem contar muitos detalhes. Como as histórias são todas reais, também é difícil também que algumas histórias fiquem interessantes.

Espero que vocês vejam tudo por outro lado. As Crônicas são um grito meu e um presente para todos vocês.

É provável que este blog fique um pouco abandonado durante este período. Quero me fixar em aprender a escrever em prosa. Conto com o conselho e a ajuda de todos vocês e, principalmente, paciência enquanto eu passo por este momento de transição da poesia para a prosa.

Se não quiserem eu entendo.

Amo cada um de vocês.

Abraços

Meu Bom Jesus do Morro do Jacarezinho

Pintura: Matthias Grünewald, a crucificação

.

Meu Bom Jesus do Morro do Jacarezinho

Me ensina a rezar contente, mesmo sozinho

E quando a dor bater no peito, me olhe tão doce

Que eu, insensato e seguro comece a acreditar

.

Meu Bom Jesus do Morro do Jacarezinho

Carrega por aí suas chagas, coroa de espinhos

Me ensina também a andar no mesmo caminho

E a acreditar num mundo melhor, com gente sorrindo

.

Meu Bom Jesus do Morro do Jacarezinho

Com pés descalços, roupas rasgadas e dentes tortos

Não sei como não morre de frio, jogado na praça da zona sul

Enquanto as mulheres pintadas se vendem indóceis

Cada uma delas traz uma oração decorada na língua

Marias Madalenas tupiniquins em praias famosas

.

E quando eu chorar de medo nas noites iluminadas

Com estrelas cadentes que colorem os morros

Vou me lembrar do sorriso sereno de crucifixo

Quando passaste por mim e falaste seu nome…

.

Meu Bom Jesus do Morro do Jacarezinho

Quando você procurar os teus filhos pra se drogar

Se lembre de mim e de meus vinte e três anos de estrada

E de quando éramos amigos, futebol a jogar

.

Meu Bom Jesus do Morro do Jacarezinho

Nem santo, nem puro, nem filho de Deus, sabemos nós

Na terra sanguinolenta do Rio de Janeiro

Não poderia pisar um novo Messias

.

Meu Bom Jesus do Morro do Jacarezinho

Não se preocupe, pois não te denunciarei

As tantas Marias que lavam teus pés com lágrimas

Continuarão a acreditar em milagres que nunca virão

.

Meu Bom Jesus do Morro do Jacarezinho

Constrói castelos de cartelas de munição usando crianças

E batiza teus filhos com Jordões de sangue

Para lucrar mais um pouco com ouro de pó…

.

Meu Bom Jesus do Morro do Jacarezinho

Não se preocupe mais que César já vem

Com helicópteros blindados tapando os céus

Pilatos que não preocupam em lavar as mãos

.

Meu Bom Jesus do Morro do Jacarezinho

Quem dera poder pedir aos anjos pra lhe salvar

Quando as tropas imundas lhe vêm fazer sacrifício

Uma cruz concreto já pronta pra lhe pregar

.

E quando levarem pra lá o Jesus de Jacarezinho

Sangrando e medroso como qualquer mortal

Não sei se no dia terceiro teremos surpresas

Pois a páscoa esperada veio no natal…

.

Se ninguém mais se lembrar do Jesus do Morro

Serei eu, o poeta, a escrever sua história

Meus dedos dedilham um novo Evangelho

Pra contar os pedidos duma terra esquecida

.

Pois os filhos não tiveram expiados os pecados

Nenhum cordeiro imolado por nós dará a paz…

.

******************************************************

Esse é mais um dos poemas em que tento explorar a brasilidade. O Brasil é um país reconhecido tanto pela sua religiosidade, quanto pela esperança de dias melhores. O Bom Jesus do Morro do Jacarezinho é uma expressão messiânica dos desejos de uma comunidade local, o morro, por dias melhores. Assim, muitas pessoas despejam suas esperanças em um símbolo, um anti-herói, um anti-clímax.

O Bom Jesus é inspirado num personagem real que vi no trem numa de minhas andanças. Ele é representativo de uma classe inteira de brasileiros que é visto como exemplo em sua comunidade, mas é entregue em expiação. As tropas de César (que pode ser entendido aqui como o prefeito César Maia) invadem o morro e matam o Cristo, que não era nem Cristo, nem cordeiro, e seu sacrifício não trará nem paz, nem dias melhores…

O Bom Jesus é, para mim, um homem normal, um pouco vítima e um pouco santo, como todos os símbolos. Embora o fim seja trágico, reflete um sentimento coletivo de descontentamento, de sabedoria…

Bem, eu tentei colocar isso. Espero que vocês gostem…

 

Brasil

Faz na zabumba ranger

Faz o batuque sambar

Faz o timbolelê

Faz o timbolalá

Dona baiana saber

Que o mamulengo está

Mumulengando de cá!

Quem foi que mandô

O cuzcuzeiro queimar

A sanfona gemer

Triângulo a ressoar!

E no quintal da mulata

Sobe no rabo da saia

Sobe no morro o sinhô

Sobe na Terra o descanto

Sei que sou o que restou

Macaxeirando as histórias

Queimando nas rodas criolas

O fumo, azeite de África

Colonizando a Europa

Com o som das navalhas

As bicas reluzentes de sangue

As pernas amarelas de angu

As veias que saltam provérbios

Palavras que são cobertor

Eu quero matar os meus versos

Eu quero cortar os meus lábios

Eu quero sangrar os meus pulsos

E o coração tropical

Fantasmas inglórios e injustos

Me cercam de carnaval

Maracangalha que vou

Fazer um bacanal

No Brasil, canavial

E a cana Caiana me serve

Pirassunungas indígenas

Pátria mãe gentil

Vou me melar de látex

Vou me mandar de sedex

Vou esperar meus filhos

Encherem de pó minha rede

Surrupiar meus sentidos

Domingar meus encantos

E o que o Espírito Santo

Não brigue nunca comigo

Vou nessa televisão

Comandar a revolução

Cultural

É a Terra que geme e implora

Volta pro Mar que melhora

Volta pros santos sinais

Filhos que dormem no Cais

Cães que remexem as palavras

Cães que simulam a toada

É o cobertor das histórias

Parte de mim vai à forra

Querendo ser mais que sou

Querendo ser mais de mim

Poema que não tem fim…

.

Fim

Samba-Jazz-Zouk-Anglo-Franco-Brasileiro

Brigitte

Foto: Ivan Ulmann

Na rua, Brigitte Bardot,

Tava me acenando do trem

Me confundiu com alguém

E me chamou de my love

“’Cause I everyday

Feel the sound of your heart

And now everything is OK

In the lights, sambarilove”

.

Na rua tudo é só salsa

É estranho quando ela passa

Parece passista de samba

Dançando um tipo de Jazz

Zouk rodado e baiano

Na ginga do rei Pelé

.

E então, Brigitte Bardot,

Me olha meio sem graça

Não sabe falar de amor

Mas tem um olhar que me arrasa

E arrasta o pé no salão

Baião de dois bem na praça

“Les sentiments sont les mêmes

L’automne ou en hiver

L’amour, c’est l’amour qui est le même

L’amour, c’est l’amour que é bacana”

.

É o filho do dono de mim

Saudade que não tem fim

Brasília com budas ditosos

Malandros da lapa são prosa

Quem foge da raia é que posa

Nas poses mais nebulosas

Quem sabe estrela cadente

Queimando no céu as palavras

Me risque com dedos em riste

Me puxe pra terra dos anjos

Onde não há Brigittes

Onde não tem Marilíns

Voando em zeppelins

E todos os dias são março

Águas que fecham o verão

Anacronismos cabanos

Candangos cubanos em marte

Banespa

Banespa

Vindo da rua é de mim

Vindo da rua é melhor

Vindo da rua é sinal

Vindo da rua através

VIndo da rua, o suor

Vindo da rua, ilusão

Vindo da rua solidão

Vindo da rua paladar

Vindo da rua o revés

Vindo da rua a miragem

Poesia, paisagem, serragem

E céu

.

Vindo da rua, o real

Vindo da rua, o senhor

Vindo da rua, o sopé

Vindo da rua ou a pé

Vindo de carro e metrô

Vindo de pé e com dor

Vindo dali pra correr

Vindo dali pra saber

Vindo dali pra sonhar

Pois o ceu é bem perto de cá

Pois o vento me traz solidão

O vento não tem direção

O vento não sopra sem mim

O vento não tem mais fim

O vento não tem mais som

O vento ficou ilusão…

*************************************

Inspirado pela visão deste prédio ai em cima. Visão de uma selva de prédios, quase tão grande quanto a dos manauaras…

***********************************

Eu queria MESMO falar da minha ida a sampa mas, como as MENINAS sabem, eu nao tenho tempo nem pra colocar link nesse post. Então, vou postando aqui as impressões fabulosas, quase que diariamente, esperando assim dar um pouquinho das sensações…

.

Maiores detalhes no MSN…

.

Quando der…

.

rsrsrsrs

********************************************

Bem, este post tinha ate acabado, mas visitando uma amiga que sempre comenta aqui, eu tive uma idéia que saiu, assim do nada. Espero que ela goste…

Marília

Marília

Marilice

Loira de Dirceu

Que disse

Que a sandice

Monotônica

Marilítica

Vai se desfazendo

Pelos ares

Dominando cores

Caminhando em torres

Dos desequilíbrios.

.

Marília

Em seus olhos sorumbáticos

Diz desesperada e vistosa

Que a flor cálida da noite

Em sua corrida contra o sonho

Se sincopa e simplifica

Produz dó e sentimento.

.

Onde eu for que seja breve o sonho

Que se não for a cor Marilítica

Não se quede paralítica

Mas brilhe antropómorfica

Causando ciúmes no sol

E dominando a lua,

Espelho imortal de mim

***************************************

Tá, tá, ultima coisa, computador desconfigurado, logo sem acentos. Vai ficar assim…

E tem coisa nova no Morango. Visitem…

*************************************

UPLOAD: Editado e pronto para comentários